Ai que saudade da minha cidadezinha provinciana de
outrora, onde os meios de locomoção eram charretes, bondes e o caminhar
descompromissado! Cidadezinha onde portas e janelas nada mais eram que,
respectivamente, sinônimos de entrada e saída e de lugar de contemplação. Já
que não havia a necessidade de serem obstáculos a evitar possíveis violações
alheias, pois todos nos eram bem familiares, devido à amistosa convivência.
Bons ares eram os que respirávamos nela! Cada brisa
que adentrava nos ambientes familiares era como se anunciasse alguém que
chegava para uma visita ou da labuta diária, para dizer que uma flor
desabrochou nos jardins ou para avisar qual fruto imperava na estação. De tão
puro que era, podíamos tudo isso perceber.
Hoje choro essa saudade, pois não vejo mais a terra
batida das ruas, já que o asfalto a cobriu, impedindo-me de sentir o cheiro
forte de terra molhada pela chuva. Tudo isso ocorreu, só para dar passagem aos
automóveis que desbancaram a charrete e o bonde, causando o comodismo nas
pessoas, matando o saudável hábito daquele caminhar sem pressa.
Todo progresso tem seu preço, com o automóvel não foi
diferente. O homem fascinado, não liga com tal pagamento e, assim, vai poluindo
a natureza que tanto lhe foi companheira, desde os tempos de infância até se
tornar homem feito. Dói em meu peito
este ar que agora respiro, o qual, por imposição da Modernidade, perdera a
pureza de outrora.
Fico triste em ver as janelas e portas, que antes
adornavam os doces lares, transformadas, por grades, em instrumentos de
distinção, graças à violência entre quem é conhecido ou desconhecido, como se deixássemos
de ser semelhantes. Fruto de mais uma cruel consequência da Modernidade, que
consiste, devido à competitividade, na marginalização, já que muitos ficam pelo
caminho rumo a tão desejada realização pessoal. Afetando o mais pacato dos
cidadãos, fazendo-o cometer atos vis que nunca imaginou cometer.
Desde o trânsito que mata e cerceia o ir e vir dos transeuntes, até esta distinção social que faz com que o semelhante viole o alheio e fraterno lar, para surrupiar o que não lhe pertence, só para saciar uma básica necessidade que bem poderia ser suprida por medidas decentes de honestos governantes. Por tudo isso que vi e descrevi da minha outrora provinciana cidade, percebo que a Modernidade fez com que ela involuísse por completo. Inclusive e, principalmente, nas relações humanas, que de tão boas que eram, consideravam-nas o nosso cartão de visita. Esse retrocesso culminou em mudanças cruéis nos hábitos e costumes que, mesmo parecendo antiquados, proporcionavam uma saudável convivência a seus velhos e jovens moradores. Portanto, hoje somos um subproduto dele, um aglomerado de seres individualistas, incapazes de conviver sincera e fraternalmente, uns com os outros.
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