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DO BEIJO QUE FICOU NO AR

Naquele dia em que nos vimos pela segunda vez, confesso que estava não inseguro, mas muito ansioso. Uma vez que planejara tanta coisa para tão esperado momento.
Quando chegaste com tua amiga e foste logo segurando a minha mão, senti-me tomado por uma empolgação tamanha, que assim que nos despedimos dela, fui logo abraçando a tua cintura. Porém, não quiseste olhar para mim, alegando que acordara há pouco. Não me fiz de rogado e fui beijar o teu cabelo, da mesma forma, repeliste este meu gesto. Logo fiquei descontente e murmurei algo, que de nada adiantou, pois continuaste irredutível.
Ao pegarmos o ônibus que te levaria ao teu doce lar, sentei-me bem juntinho ao teu lado. Pedi um beijo, e com palavras me negaste. Só que os teus olhos me diziam o contrário e investi de forma sutil, todavia provocante. Com pequenos e breves beijos, fui preparando o teu inseguro ser para o gesto que tanto ansiávamos. Só que, inesperadamente, antecipaste o término do ato e nossos dentes acabaram por se encontrar, em um choque nada agradável. Com isso, foi veemente a tua nova negativa. Ainda insisti com uma nova tentativa, no entanto nada aconteceu. Resolvi apelar com outros gestos que só conseguiram te fazer estremecer, mas não cedeste, a ponto de me dares o tal beijo.
Chegaste a teu destino, sem que tivéssemos desfrutado daquilo que sei que, igualmente, desejávamos. Ainda falei que ficarias a me dever outra oportunidade, que nunca veio a ocorrer.
O tempo passou, acabamos por nos encontrar, só que em uma ocasião diferente, na qual foste acompanhar uma pessoa de convivência em comum. Tudo conspirou para nossa desunião e ficamos separados por longos catorze meses, nos quais quase nada sabíamos um do outro.
Passado esse tempo, inventaste um pretexto para falar comigo e eu, ainda abatido pela perda de um ente querido, respondi a ti sem oposição ou questionamento. Desde então, estamos a nos falar, contudo sem aquela gostosa sensação de um desejo em comum. Talvez cientes de que falhamos em algo, na verdade, em alguns pequenos detalhes que colaboraram para não realizarmos o que tanto queríamos.
Não sei de ti, mas penso que algo ficou por realizar. Talvez, quem sabe, a execução daquele beijo que ficou até hoje suspenso no ar.
Criado em: 12/02/2004 Autor: Flavyann Di Flaff

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