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REFLEXO REVERSO

(Imagem: Nick Brandt)

Eu, como Ícaro, que, com suas frágeis asas, ousou ir em busca de uma liberdade desobrigada de convenções, mesmo ela tendo custado a sua própria vida, sobrevoei a vastidão de teu coração. Nele, a extrema natureza reflexiva de teus sentimentos me atraiu. A insinuação de reciprocidade era tanta, que não hesitei e pousei nesse lago de águas tranquilas. Ali fiquei, alimentando-me do que proporcionavas. Uma calmaria insuspeita, um ambiente propício à integração de sentimentos. Mas não sei o porquê, fui sentindo um mal-estar, uma inquietação inadequada para o momento, já que não via motivos para tanto. O desassossego não cessou e, aos poucos, fui percebendo que a causa disso era a tua indiferença que, sorrateira, tomava conta da relação. Não dera fé antes, pois estavas sempre presente e isso me proporcionava segurança, porém, o teu distanciamento sentimental, só aumentava. Foi então que me dei conta de que os teus sentimentos refletiram apenas a ilusão de uma reciprocidade, pela qual fui tolamente atraído, como um pássaro que se vê refletido em uma janela de vidro. Assim, o teu amor, lago de natron, seduziu-me e fez-me mergulhar em suas águas alcalinas, matando e calcificando o meu sentimento, conservando e eternizando esse desumano momento.

Criado em: 14/06/2020 Autor: Flavyann Di Flaff


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