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ALÉM DA IMAGINAÇÃO


Na velha estação ferroviária
permanecia a eterna presença
de uma locomotiva
e seu vagão de passageiros.
Lembranças de tempos idos
nos quais as pessoas seguiam
para algum lugar específico.
Hoje, ela já não leva mais
ninguém a lugar nenhum,
confessa-nos, convicta, a lógica
da obsolescência das coisas.
Porém, a criança em mim
não leva a sério tal certeza,
prefere dar voz e vez
ao que tem de melhor
em sua essência:
a imaginação.
Dirijo-me ao vagão,
entro e sento-me
em um dos inúmeros assentos,
mas não em qualquer um,
dou preferência àquele
que fica ao lado da janela.
Assim, olhando para a
paisagem campestre,
principio a devanear.
Então, a paisagem, antes estática,
começa a ganhar movimento,
a vegetação local
vai ficando para trás,
logo começam a aparecer
os primeiros povoados,
repletos de gente simples,
entretidas com seus afazeres.
O gado pastando livre,
os outros animais domésticos
seguindo a sina imposta.
O tempo passa veloz,
como se quisesse zombar
do seguir moroso
da Maria-fumaça.
Na verdade, ele só queria
lembrar do agora,
instante em que vivo,
o que fez cessar a minha viagem.
Lá estava eu, de volta 
à conhecida paisagem,
dentro da obsoleta locomotiva 
naquela velha estação.

Criado em: 03/05/2020 Autor: Flavyann Di Flaff

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