Eu, quando criança, nas horas vazias do dia, ficava a contemplar o sol até ele se retirar do imenso palco azul-celeste. Por não ter ainda o juízo formado, ficava encafifado com esse sumiço, pois não sabia o destino dele. Certo dia, cansado de nada saber, decidi conhecer onde o sol se embrenhava, depois de findar mais um dia. Quando a luz natural do cenário celeste foi sumindo, fui seguindo, de mansinho, o andar ágil do douradinho, era assim que o chamava. Ele não olhava para trás, seguia sempre em frente, melhor para mim, assim não precisava ficar se escondendo nas moitas do caminho. Não fui muito longe, porque, logo ali na esquina do tempo, o sol dobrou e se encontrou rapidamente com a lua, deu-lhe um ardente beijo e desejou-lhe uma boa noite, até sumir de repente. Fiquei boquiaberto, não desconfiava que ele tinha família, que o dia era a sua labuta e a noite o seu merecido descanso. Neste mesmo instante, lembrei-me do meu velho e saudoso pai, até parece que era colega de trabalho do sol, de tão cedo que acordava e saía para a sua jornada diária. Quando acordávamos, já tínhamos o dia todo para aproveitar, e como acontecia com o douradinho, nem dávamos contar do nosso pai. Porém, quando já estava a surgir a noite, o desejo da presença dele era forte, todavia o cansaço das estripulias do dia nos vencia e dormíamos, na certeza de que a sua presença e a da nossa mãe velavam o nosso inocente sono. Assim, naquele fim de tarde, descobri que, como o sol, o meu pai também saía de cena, para, junto com a minha mãe, renascer forte todos os dias de nossas frágeis vidas.
Criado em: 16/03/2021 Autor:
Flavyann Di Flaff
Comentários
Postar um comentário