As
ruas da periferia deram-me voz. Porém, lembrar as nossas agruras, todo dia, soa
como uma ladainha, que parece nunca chegar ao santo e aborrece a quem chega perto
um tanto.
Se
eu queria ser ouvido, deveria ir aonde o povo tem vez e voz. Para ascender ao
Cosmos – templo da racionalidade – fui indicado por uma recomendação popular, e
tudo que defendia no caos ordenado – paraíso da plebe, finquei como bandeira no
plenário. Pelos meios regimentais, tentei promover diversas reformas, tanto no
âmbito social como no político, o que abalou algumas estruturas ali cristalizadas.
Na Câmara das Representatividades, os meus pares sentiram-se ofendidos, e municiados por narrativas desconexas, distorceram este ocorrido, uma simples homenagem-protesto passou a ser vista e tratada como uma violenta invasão, uma verdadeira afronta a um templo religioso. Nessa deturpação, reside uma triste ironia, a igreja “afrontada” pertence a uma santa cujo nome a meu povo referencia. Desde então, um duro julgamento enfrentei, cheio de provocações e armadilhas, por fim, os meus pares, pelo regimento interno, condenaram-me. Lembrando o episódio em que César, pensando que, pelos grandes serviços prestados ao Estado, era admirado por todos, foi ao Senado, e lá, até por seu próprio filho foi assassinado. Então, inconformado, perguntei: ─ Até vocês, pares meus? Obtendo, como resposta, um silêncio sepulcral.
Criado
em: 16/05/2022 Autor:
Flavyann Di Flaff
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