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EM DEFESA DAS NOSSAS RESERVAS

                               

Por muito tempo, sofremos influências e interferências europeias nas mais distintas áreas institucionais. O fato que se passou e agora vou contar-lhes, não passa ao largo disso. Eram meados da década de 30, quando, lá pelas bandas do nordeste brasileiro, o açúcar estava em alta e toda cidade prosperava junto, um rapaz resolveu, por convenções da época, iniciar a sua vida sexual em uma casa apropriada para tão relevante fase de um futuro homem. Nessa ocasião, as pensões de moças desfrutáveis se proliferavam e seguiam o ritmo das classes sociais. Tinham as de nível rasteiro, para os trabalhadores braçais; as de nível intermediário, para os agenciadores de mão de obra e, por fim, as de nível alto, para os senhores de engenhos, cheios de dinheiro para gastar. Estes chegavam a dar mimos para as suas moças prediletas. Mas o nosso jovem não vinha desse berço, nascera sobre uma cama de vara e aos cuidados de uma velha parteira, portanto cobres eram o seu fraco. Encheu os olhos e a mente ao ver tantas beldades a desfilar diante dessas pensões de luxo. Instigado por tais exuberantes imagens, foi em busca do que podia proporcionar o pouco que conseguira na labuta diária no canavial. A rua das pensões rasteiras ficava bem distante dessas que o encantou, porém era o que podia frequentar. Lá chegando, encontrou uma com a qual se identificou, foi logo entrando e sendo abordado por uma mulher que fez as cerimônias da casa. Estava tenso, resolveu, então, tomar algo para relaxar, antes de se aventurar no campo do amor. Sentado, degustando lentamente a cerveja, viu o burburinho inicial aumentar como o estrondo de uma onda a denunciar a tempestade que já surgia. A agitação cresceu e tomou conta de todo o ambiente, não tinha como ficar alheio. O movimento se deu porque uma jovem estrangeira tomara o homem das mãos de uma nativa, o que foi suficiente para criar tal confusão. O ambiente era de pura lascívia, contudo tinha lá os seus códigos de conduta e honra – sombras de alguma dignidade. Não era permitido ali, tamanha desfeita, ainda mais por ter sido feita sob a promessa de coisas que as nativas jamais praticaram no leito, as tais novidades libertinas trazidas pelas europeias. Indignadas, as nativas disseram que ali não era casa de sem-vergonhices, que a francesa fosse para os infernos. Os homens tentaram acalmar a situação, todavia não teve jeito, tiveram que clamar pela mulher mais experiente da pensão, no intuito de ela tudo solucionar. A meretríssima se anunciou e depois de expor os seus argumentos, decidiu que a partir de então, não seria mais permitida a entrada de estrangeiras naquele recinto. Portanto, decreto publicado, cumpra-se a lei, e a francesa teve que ser convidada a sair só com a roupa do corpo. Ah, não esquecemos do nosso jovem! Ele acabou sendo favorecido pela confusão e iniciou, com louvor, a sua pregressa vida sexual.

Criado em: 03/10/2020 Autor: Flavyann Di Flaff

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