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DA ARTE DO DESAPEGO

Desapegar, para alguns seres humanos, é algo complicado. Com a intenção de conseguir tal intento, decidi procurar o Tempo, na tentativa de aprender o modo como ele faz para ser tão desapegado de tudo e de todos. Encontrei-o a se perder pelo espaço afora. Compromisso não marcado, encontro casual, já que o Tempo não é gado, mas água que flui, e ele ao passar pelo leito de muitas vidas, passado já é.
Na reunião, o Tempo não estava bom para ninguém! E como uma criança que abre a boca, come e sai a correr, para, só depois, voltar e terminar o intermitente momento da refeição, ele assim agia comigo. Mal começava a falar, saía a passar pelo mundo afora, para, só depois, retornar e retomar a conversa, tudo isso, em intermináveis intervalos de um piscar de olhos.
Na difícil arte do desapego, não existe mestre maior do que o Tempo. Ele perpassa por coisas e eras, por inúmeras gerações de homens e de feras, sem se deixar prender a momentos saudosistas, simplesmente, seguindo adiante. Mantendo a mística de consolador, de inspirador de redenções, de renovador da esperança, todavia, repito, sem se apegar, apenas incentivando.

Criado em: 04 e 07/01/2020 Autor: Flavyann Di Flaff

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